CLUPAC - Clube Português de Coleccionadores de Pacotes de Açúcar

quinta-feira, janeiro 04, 2007

COINCIDÊNCIAS

Certo dia tive que deslocar-me aos Açores em visita de trabalho, mais concretamente à Termoeléctrica da Ilha Terceira. Num voo que saiu de Lisboa às 9 da manhã, tive por companheira uma freira já idosa, que se movia com bastante dificuldade, queixando-se dos pés. “O aeroporto é muito comprido”, lamentava-se. Depois de a ter ajudado a sentar ao meu lado, conversou comigo a viagem toda até à ilha Terceira. Habitava num lar que acolhia meninas desamparadas em Miranda do Douro. Nesse dia saíra de casa às 4 e meia da manhã, para ir para o Porto, onde apanhara um avião para Lisboa. Depois duma escala em Lisboa em que tivera que percorrer quilómetros dentro do aeroporto, ali estava ela a caminho dos Açores. Da Terceira, onde eu me apeava, ela ainda seguia de avião para o Faial, de onde havia de apanhar um barco para o Pico, onde tinha uma irmã à espera, para com ela passar uma semana de férias!

Depois de concluída a minha visita à termoeléctrica e duma curta reunião com os meus clientes, o meu dia de trabalho estava terminado. O meu voo de regresso a Lisboa, por volta das 6 da tarde, foi num avião que vinha já do Faial. Fiquei ao lado duma passageira que vinha em trânsito, uma jovem de cabelo claro – a Maria João – que falava pelos cotovelos: “Ai como estou desejando de chegar a casa! É tudo muito bonito, muito bonito, mas eu já estava fartinha de tanta beleza natural”. Contou-me que era professora primária, que tinha sido colocada nos Açores e que finalmente conseguira colocação numa escola do continente. “Vê lá tu que hoje já apanhei o barco do Pico para o Faial às 4 e meia da manhã. No Faial apanhei o avião para a Terceira, e agora vamos para Lisboa. Mas em Lisboa tenho o meu namorado à espera e depois ele leva-me de carro para Miranda do Douro, que é a minha terra. Vê lá a que horas é que vou chegar!”

A coincidência era notável. Do curtíssimo universo das mulheres que viajam entre Miranda do Douro e a ilha do Pico, no mesmo dia eu tinha acompanhado duas, em ambos os sentidos. Mas as coincidências não ficavam por aqui. Estávamos quase a aterrar em Lisboa e a minha companheira tinha espalhados vários cartões telefónicos. Perguntei-lhe se os coleccionava, mas disse-me que não, que os usava para fazer chamadas e estava simplesmente a juntar os que trazia soltos na carteira. “Aliás, acho isso uma parvoíce, coleccionar cartões de telefone”, disse ela. Contei-lhe então que eu fazia uma colecção que ela provavelmente acharia também uma parvoíce, que era de pacotes de açúcar. Deitou as mãos à cabeça, olhou para mim com um ar aterrado e gritou: “Não pode ser! Tenho mais de mil!”. Depois contou que juntava há muito tempo e que os tinha guardados em caixas, lá para o sótão da mãe. À chegada a Lisboa, fez questão de me apresentar ao namorado e despedimo-nos com abraços e beijos, como grandes amigos, com a promessa de que me daria todos os seus pacotes – pois já não os queria – desde que os encontrasse, lá em casa da mãe.

No meu escritório, esperava-me uma consulta para fazer uma inspecção à barragem de Picote. Na semana seguinte partia a caminho de Miranda do Douro, a cidade mais perto de Picote, onde fiquei hospedado por uma semana durante a execução desse trabalho. Ele há coincidências...

Rui Colaço
Sócio Nº 6 do CLUPAC

1 Comments:

  • Caro Rui, caros Amigos
    Já tenho escrito noutros lados que não acredito em coincidências, salvo a "grande coincidência" que deu origem ao Universo e que amiga ligada a essas coisas um dia me explicou tão bem. Agora, que o muito querer e sentir faz com que as pessoas se cruzem de forma especial, não tenho qualquer dúvida. Bonita recordação. Um abraço.

    By Blogger Vicktor Reis, at 9:24 da manhã  

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