coleccionar com doçura
Coleccionar, juntar e encontrar elos de comunhão entre as peças sempre foi aliciante para o ser humano. O coleccionismo de pacotes de açúcar colocou esse anseio ao alcance de toda a gente. Os pacotes de açúcar dão rosto a pessoas e acontecimentos exemplares na solidariedade, no saber, na afectividade
Café de saco em copo de vidro
Naquele tempo era raro ver entrar uma mulher no bar que tradicionalmente era reservado aos homens. Por nenhuma razão especial, tão somente pela tradição “importada” da conservadora Albion que naquele bar se acoitara em tempo de guerra, usando da “neutralidade” deste Portugal esquecido e isolado no extremo ocidental da Europa.
Estamos no British Bar, na zona ribeirinha do Tejo, no cais do Sodré.
_Ó Silva, por favor traz dois cafés, um é de saco em copo de vidro, e dois especiais com gelo!
O café de saco em copo de vidro grosso e lapidado ao jeito de a mão pegar e o “especial”, digestivo cuja composição é mantida no segredo pelos proprietários do bar, mas com capacidade para provocar fortes efeitos na libertação do espírito e na inspiração de artistas e de poetas.
O saudoso escritor José Cardoso Pires era cliente habitual deste ritual de anos vividos.
Enquanto observávamos os pacotes de açúcar com “puzzels” fazendo parte de uma série que anos mais tarde iriam fazer as delícias dos coleccionadores, abrem-se as portas de batente que desde a rua dão acesso ao bar e entra o senhor Carlos, o cauteleiro, “amanhã anda a roda, só não sai a quem não joga”, conhecido e respeitado no Cais do Sodré, o “marrequinho”, amuleto das prostitutas do Texas Bar e de outros do mesmo tipo de clientela da zona, que nele depositavam a esperança de um dia deixarem “esta vida”.
O senhor Carlos dirige-se à “mesa dos espiões” onde nos encontramos sentados. Situada no canto mais discreto do British Bar, contam os mais velhos que no tempo da Guerra (II Grande Guerra Mundial) nesta mesa se encontravam, sabe-se lá com que secretos desígnios, os chefões locais da espionagem da Alemanha e da Inglaterra, este último a jogar em casa. A “casa” o seu antagonista situava-se um pouco mais acima, na Rua do Alecrim, a Cervejaria Alemã.
O senhor Carlos “cortou” para o meu amigo Pedro um “número certo”, para mim um qualquer desde que terminado em 9. Actos irrelevantes pois a “roda” somente anda amanhã.
Saímos... uma última olhadela para os pacotinhos de açúcar que trazíamos connosco...
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